Produção Científica - Artigos e Capítulos

DIMENSÕES ÉTICA, POLÍTICA E ANTROPOLÓGICA DA INTERVENÇÃO GESTÁLTICA NO CAMPO DAS PSICOSES

DIMENSÕES ÉTICA, POLÍTICA E ANTROPOLÓGICA DA INTERVENÇÃO GESTÁLTICA NO CAMPO DAS PSICOSES

MÜLLER, M.J.; GRANZOTTO, R.L.

Atenção gestáltica às psicoses: em torno e mais além da awareness

Por meio da noção de ajustamento criador, o que os clínicos gestálticos originalmente pretendiam era ocupar-se da experiência do contato com awareness, entendendo-se por awareness a capacidade dos corpos para desencadear, junto aos outros corpos, um horizonte de futuro para aquilo que entre eles fosse ambíguo, precisamente, a impessoalidade dos hábitos compartilhados. Cada experiência de contato com awareness seria um ajustamento criador, embora nem toda a experiência de criação fosse uma vivência de contato com awareness. O que, por fim, nos possibilitou (Müller-Granzotto & Müller-Granzotto, 2008), sessenta anos mais tarde, ampliar a noção de ajustamento criador e incluir, como uma de suas modalidades, uma vivência de contato que não necessariamente implica um fluxo de awareness, como parece ser o caso das experiências que envolvem formações psicóticas (mutismos, alucinações, delírios, identificações arbitrárias...). Afinal, podemos admitir alguma sorte de awareness em nossa interlocução com o mutismo, com as alucinações, com os delírios ou com as identificações arbitrárias? O que há nas formações psicóticas que possa ser considerado desejável (entendendo-se por desejo o horizonte de futuro visado na experiência de contato com awareness)? E acaso não seja possível desejar uma formação psicótica, que tipo de experiência nós podemos ter, senão dela, ao menos das pessoas associadas a ela?
É muito importante esclarecer de antemão que, quando propomos a ampliação da noção de ajustamento criador, de sorte a incluir as formações psicóticas, não estamos defendendo uma tese de inspiração nietzschiana, segundo a qual, em qualquer situação, sempre é possível “criar alegria”, “transvalorar” as moralidades, reinventar o sentido na própria partição dos significantes, “fazer contato com awareness”... Esse otimismo em torno do criar tornaria a noção de ajustamento criador um operador equivalente – por exemplo - ao “Ser-Uno-Todo-Virtual” de Gilles Deleuze (1986), como se cada experiência criativa fosse apenas mais um “simulacro” não-relacional de uma mesma interioridade virtual doadora insensata de sentido como pura duração, como afirmação do acaso e do eterno retorno. Ou, talvez, o otimismo em torno do criar tornaria a noção de ajustamento criador um equivalente da idéia (pessimista) de uma estética da existência voltada para a auto-perfeição e auto-afirmação do sujeito, como se, dando ênfase aos prazeres e não ao sexo, os sujeitos poderiam reinventar-se, sem recorrer às identidades criadas pelo sistema de nominação preconceituoso articulado aos dispositivos de sexualidade (conforme Foucault, 1981; 1984). Assim como cada simulacro derivado da dobra do ser sobre si mesmo, ou tal como os modos de redescrição da subjetividade revelados pelas múltiplas singularidades, a noção de ajustamento criador corresponderia a uma espécie de racionalidade do acontecimento, capaz de assegurar a unidade da experiência - mesmo abrindo mão das pretensões metafísicas de apoditicidade (universalidade e necessidade). Na contramão desta versão filosófica de emprego da noção gestáltica de ajustamento criador, nós preferimos dizer que a razão (inclusive a dionisíaca) não está em todo lugar (em todo simulacro, em toda singularidade, em todo contato...). Ou, então, nós preferimos seguir Perls, Hefferline e Goodman (doravante PHG) (1951, p. 33), quando admitem que nem sempre o contato esta seguido de awareness. Mais precisamente, acreditamos que o contato com awareness – e que se define pela abertura de um horizonte de desejo a partir da recriação atual do fundo de hábitos – nem sempre é possível. Ainda assim é possível o contato e, por conseguinte, um ajustamento criador. Evidentemente, este ajustamento terá um matiz muito diferente daquele que envolve awareness. Ele não mobilizará um fundo de excitamentos, tampouco desencadeará um horizonte de desejos, como se cada experiência de contato contivesse um núcleo inquebrantável, qual “rizoma” ou “estrutura” mais além da contingência da realidade empírica em que se está situado. Ao contrário, tratar-se-á antes de uma experiência enraizada na realidade; tão fixada nos diversos conteúdos (vociferantes, imagéticos, imaginários, pensados...) disponíveis que dificilmente parecerá inteligível ou desejável, como é o caso das formações psicóticas em geral.
Alguém poderia contestar nossa posição e lembrar que as formações psicóticas geram sim desejo. Elas são temáticas recorrentes na produção de muitos literatos, filósofos, psicólogos, cineastas... Como afirmar que os delírios não são interessantes depois de lermos o “Simão Bacamarte” de Machado de Assis em O Alientista (1886)? Como não se encantar com as logolalias de Estamira depois do premiado documentário de Marcos Prado? Todavia, todos concordarão que há uma diferença entre as formações psicóticas da Estamira que vive na cidade de Rezende no Estado do Rio de Janeiro e aquelas capturadas pelas lentes do cineasta. Mesmo na hipótese de que o recorte estabelecido pela câmera tenha preservado o essencial da forma como Estamira opera no cotidiano, mesmo que as lentes tenham conseguido capturar as formações psicóticas de Estamira ante aqueles que efetivamente convivem com ela, tal não é garantia suficiente de que o interesse dos espectadores do filme seja pela loucura de Estamira, antes pelo “filme” sobre a loucura de Estamira, pelo enquadre cinematorgráfico de uma vida que só participa da nossa a título de gênero artístico, reflexão política, propaganda ideológica, entretenimento, ilustração moral... O que, evidentemente, não tira o mérito do diretor e de sua equipe. Eles souberam produzir aquilo que, a partir de suas condições sociais, Estamira talvez não fosse capaz de provocar, caso quisesse ou devesse, precisamente: desejo. Por isso, conforme pensamos, nós não podemos confundir as formações psicóticas que nos visitam no cotidiano com o desejável elogio à loucura professado por grandes pensadores, como Platão, Schopenhauer, Freud, Jaspers, Lacan, Foucault, Fellini, Ingmar Bergman, Hitchkock... Quando capturadas pelos meios de comunicação – e oxalá elas continuem sendo – as formações psicóticas adquirem um espectro de desejo que não encontramos quando as visitamos lá onde elas acontecem, no seio das famílias anônimas, que lutam para manter no anonimato este estranho para o qual não conseguem encontrar função ou destino. Em seu lugar de origem, as formações psicóticas parecem refratárias a nossa presença. Não nos interessamos por elas – a não ser quando podemos fazer delas algum objeto (de estudo, de elogio, de comercialização, de especulação...) destinado a despertar o desejo em um interlocutor que não é o próprio psicótico. E não é de todo estranho que cheguemos à conclusão de que: se as formações psicóticas causam em nós algum desejo, o desejo de fato não tem relação com as formações psicóticas, mas com o uso que podemos fazer delas em decorrência de um terceiro por quem nos interessamos mais.
De fato, para quem busca contato com awareness, as formações psicóticas por elas mesmas parecem desinteressantes, anacrônicas, inadequadas. Diante do interlocutor que espera não apenas uma informação precisa, mas uma informação com valor de metáfora, que possa ser aplicada em diferentes contextos discursivos, de modo a abrir um fluxo de conversação, o sujeito da psicose escolhe fixar-se a uma palavra, a qual, por frustrar a expectativa por continuidade na conversação, é considerada pelo demandante um equívoco de percepção ou, simplesmente, uma alucinação. Ou pode o sujeito da psicose fixar-se a um arranjo de pensamentos disponíveis e repetitivos, proferidos como se respondessem ao interlocutor, não obstante permanecerem alheios às variações introduzidas pelas novas perguntas, o que aos ouvidos do demandante soará como delírio. Pode ainda o sujeito da psicose se fixar a um romance que porventura carregasse consigo ou sobre o qual tivesse alguma informação, como se todas as perguntas que o interlocutor pudesse propor já estivessem de antemão respondidas naquela obra, o que parecerá ao demandante uma valoração maníaca da literatura.
E o que então faria alguém se ocupar deste tipo de criação, se ele não desperta por ele mesmo desejo algum? Quem conhece ou convive com pessoas que se ocupam dos sujeitos da psicose sabe que não houve para a maioria delas uma escolha: foram antes os sujeitos da psicose que se impuseram eles próprios a elas. Por vezes, fazemos parte de uma família em que, independentemente das responsabilidades, não temos a alternativa de não conviver com aquele parente que delira, alucina, isola-se... Outras vezes isto é uma exigência do próprio ofício, como sucede aos profissionais que atuam em saúde mental. Pode ainda ocorrer de a psicose nos visitar qual acidente, episódio momentâneo que, todavia, deixará marcas profundas e inalienáveis. Razão pela qual acreditamos que o lidar com as formações psicóticas não exija um desejo. Tal qual realidade, elas se impõem. Diante delas não temos a alternativa de ignorá-las, ao menos por muito tempo.
De onde não se segue que acreditemos que a experiência com a psicose se limite à atenção às formações psicóticas (mutismos, alucinações, delírios e identificações arbitrárias). Muitas pessoas se dedicam aos sujeitos das formações psicóticas por que isso significa um aprendizado, uma oportunidade de participação em uma diferença, em um modo diferente de ver o todo social. Pode ainda ser a ocasião de um provento, de um reconhecimento, certo status ou satisfação. Ou, então, o fazem por que acreditam em um ideal, por exemplo, na possibilidade de que aqueles sujeitos possam ampliar-se enquanto cidadãos, profissionais, de sorte a gozarem de maior autonomia social. É o certo – conforme mencionamos alguns parágrafos acima – que o desejável aqui não é a psicose, mas algo que se pode alcançar a partir dela, o que podemos considerar algo absolutamente legítimo. Tal como o cineasta, ou o romancista, nós podemos nos servir da psicose para produzir objetos de desejo que, inclusive, acabam por acarretar benefícios aos próprios sujeitos da psicose.
Ademais, mais além da experiência de contato sem awareness que caracteriza a atenção às formações propriamente psicóticas (ou ajustamentos de busca), mais além da atenção à psicose em nome de um desejo (de reconhecimento) que ostentaríamos em relação a um terceiro que não necessariamente tem relação com a psicose, podemos admitir uma terceira forma de nos relacionarmos com a psicose. Estamos falando do cuidado dirigido às pessoas ditas psicóticas e que envolve nossa participação nos sentimentos, crenças e pensamentos que possamos dividir com essas pessoas. Afinal, além das formações psicóticas (ajustamentos de busca) e da disponibilidade para aceitarem – segundo certos limites - nossos projetos e programas de integração social, as pessoas consideradas psicóticas têm uma participação (às vezes limitada, mas ainda assim visível) nos motivos que constituem nosso cotidiano antropológico. Elas têm vínculos familiares, freqüentam círculos de amizade, vão a festas, buscam trabalho, têm valores morais, ideologias, participam de agremiações desportivas, associações diversas, enfim, vivem esta dimensão da existência antropológica que a teoria do self denomina de função personalidade. De onde se segue haver para os gestalt-terapeutas uma terceira via de interação com as pessoas ditas psicóticas. Por outras palavras, além da estranha atenção que possam destinar às formações psicóticas, mais além dos programas e projetos com os quais tentam realizar a inclusão política das pessoas psicóticas, os gestalt-terapeutas podem compartilhar com elas uma civilidade, uma amizade, uma convivência ampla no campo da realidade social. O que nos permite inferir que a experiência gestáltica de atenção à psicose tem pelo menos três dimensões distintas e complementares.

As três dimensões da atenção gestáltica às psicoses

Conforme nossa prática clínica, acreditamos que podemos discriminar três níveis de atuação:

- Por um lado, há a atenção não-desejante ao que não-deseja, ou, o que é a mesma coisa, há a experiência de contato “sem” awareness com as formações psicóticas (com os mutismos, com as alucinações, com os delírios, com as identificações arbitrárias...).
- Por outro há o desejo por algo em torno da psicose, que não a psicose ela mesma; por outras palavras, há o contato com a psicose em nome de um desejo, como o de ver os sujeitos da psicose desfrutando de maior autonomia.
- Mas há também uma terceira dimensão, que é a convivência, o estabelecimento de vínculos diversos, o compartilhar valores, crenças e ideologias.

À primeira dimensão denominamos de “ética”: nela os gestalt-terapeutas são clínicos e sua função é acolher o estranho que possa surgir como suplência psicótica à função id. Por ética entendemos a ação de acolhida ao estranho que se manifesta no comportamento e no discurso dos semelhantes. Tal estranho tanto pode ser um hábito inibitório (como nos ajustamentos de evitação), hostil (como nos ajustamentos anti-sociais), ou, inclusive, a ausência de hábitos (como nas psicoses). Ética, portanto, não tem relação com o emprego aristotélico do termo e segundo o qual o homem ético é aquele que leva em conta os costumes e as leis de sua comunidade. Ética tem um sentido mais originário: morada em que se acolhe ao estranho.
À segunda dimensão denominamos de “política”. O significante política” está associado, nos termos da teoria do self, à ação estabelecida pelos sujeitos de ato no sentido de sintetizar, numa unidade presuntiva e virtual a que chamamos de desejo, as representações sociais disponíveis e os hábitos (excitamentos) desencadeados pelas contingências sociais presentes (demandas por representação social e por excitamento). Em tal unidade presuntiva e virtual, buscamos estabilizar como horizonte de futuro o efeito que os hábitos possam desencadear junto às representações sociais às quais estávamos identificados. Política, portanto, é para nós a maneira como tentamos incluir o semelhante e o estranho, ou a maneira pela qual somos por eles incluídos, em um todo presuntivo e virtual, a que chamamos de desejo ou, simplesmente, poder. Fazer política é participar do poder, entendamos o poder com um desejo nosso ou de nosso semelhante. Ora, no campo da psicose, porquanto os sujeitos das formações psicóticas não se apresentam como sujeitos desejantes, a função dos gestalt-terapeutas não é demandar desejo de quem não os têm. Ao contrário, o gestalt-terapeuta acompanha o psicótico para despertar desejo na sociedade. Ou, então, os gestalt-terapeutas são acompanhantes terapêuticas (ATs) que atuam em nome de desejos que possam produzidos a partir destes dos sujeitos da psicose.
À terceira chamamos de dimensão “antropológica”. Nela os gestalt-terapeutas atuam como cuidadores da humanidade (função personalidade) que compartilham com os sujeitos da psicose. Discutamos um pouco mais cada uma destas dimensões. O significante ‘antropologia’ tem aqui seu uso orientado pela maneira crítica como lemos a Antropologia de Jean-Paul Sartre (1942). Partindo da idéia de uma fonte insuperável e irredutível – que é a sua teoria da consciência – Sartre advoga que a unidade desta consciência sempre se produz na transcendência, como uma existência em situação, na práxis história. A antropologia para Sartre – entendida como o objeto primeiro do filosofar – é o estudo desta práxis histórica. Trata-se de uma investigação do homem e do humano enquanto a realização (sempre parcial) da unidade da consciência na transcendência. Segundo ele próprio, “enquanto interrogação sobre a práxis, a filosofia é ao mesmo tempo interrogação sobre o homem, quer dizer sobre o sujeito totalizador da história. Pouco importa que esse sujeito seja ou não descentrado. O essencial não é o que se fez do homem, mas o que ele faz do que fizeram dele. O que se fez do homem são as estruturas, os conjuntos significantes que as ciências humanas estudam. O que o homem faz é a própria história, a superação real dessas estruturas numa práxis totalizadora. A filosofia situa-se na charneira. A práxis é, no seu movimento, uma totalização completa; mas nunca atinge senão totalizações parciais, que serão por sua vez superadas” (Sartre, 1966, p. 95). Para nossos propósitos, aderimos à compreensão de que, na transcendência (entendida como atualidade da situação concreta e social), o homem se ocupa de superar as estruturas em que reflete a unidade de sua própria práxis histórica; e que isto é o mesmo que fazer história. Aderimos à compreensão de que a Antropologia é o estudo desta práxis histórica e da tentativa humana de superá-la. Mas, nem por isso, precisamos onerar a Antropologia com a suposição de que, tal práxis, bem como as tentativas de compreendê-la e superá-la, estariam animadas por uma fonte insuperável e irredutível, que é a consciência (enquanto ação nadificadora, apelo de liberdade sempre em curso). ). Que haja tal fonte, ou que ela se imponha na práxis histórica como uma exigência transcendental de unificação, isto é para nós uma questão a discutir e não um princípio, como parece ser para Sartre. Eis em que sentido conjecturamos, como um eventual motivo (ausente, por exemplo, nos ajustamentos de busca) que justificasse as ações de superação das identidades historicamente constituídas, a co-presença de uma alteridade radical, qual outrem (ou função id). Se é verdade que, na práxis histórica, nos ocupamos de operar sínteses a partir do passado em direção ao futuro, tais sínteses não parecem ser decorrência de uma exigência interna ou transcendental, antes um efeito da presença do estranho que se apresenta a nós a partir da demanda do semelhante. Preferimos pensar que a práxis histórica está motivada pela alteridade antes que por uma suposta unidade que nos antecederia.
Enfim, assim como os demais ajustamentos pensados a partir da teoria do self, os ajustamentos de busca são nossas tentativas para identificar qual lugar podemos ocupar diante das pessoas que nos procuram em nome de uma intimidade que decidem manifestar. Trata-se de uma proposta ética, orientada para o acolhimento àquilo que de estranho possa haver no modo como o semelhante fala da sua intimidade. No caso dos ajustamentos de busca, o estranho está relacionado às formações alucinatórias, delirantes, identificatórias e de isolamento que o sujeito produz aparentemente em resposta às nossas demandas por excitamento e desejo. E o nosso lugar diante destes sujeitos – conforme a teoria do self – tem a ver com nossa disponibilidade para acolher àquelas formações e identificar quais demandas exigiram-nas. É claro que podemos agir de maneira política, procurando despertar no meio social interesse e respeito pelas produções e limites dos sujeitos que acompanhamos. Trata-se de uma ação de tutela aos sujeitos das formações psicóticas com vistas a provocar no meio social uma ampliação na forma como o meio social ele mesmo compreende e vive, por exemplo, sua fantasia sobre o que seja a relação entre a cidadania e a psicose. Todavia, bem mais além das formações psicóticas e do engajamento em nossas proposições políticas, os consulentes também nos fornecem representações sociais às quais estão identificados passivamente, o que significa dizer, de modo espontâneo. Por outras palavras, eles também nos apresentam valores, pensamentos e instituições que constituem suas identidades sociais. A intimidade que manifestam não é aqui o estranho, ou nosso interesse em despertar - a partir da convivência com os sujeitos da psicose - algum desejo no meio social. A intimidade agora é a horizontalidade de nossa relação humana, nossa co-participação em motivos antropológicos, que possamos dividir enquanto amigos ou cúmplices, tais como a festa, o luto, a esperança, a alegria, a indignação. E eis aqui a terceira dimensão da atenção gestáltica ao sujeito da psicose, a qual está focada nisso que a teoria do self denomina de função personalidade, a saber, nossa participação na humanidade daqueles que convivem conosco. Trata-se do cuidado dirigido aos diferentes vínculos que possamos estabelecer com as “pessoas” que se manifestam mais além das formações psicóticas e dos nossos desejos.


Bibliografia

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SARTRE, Jean-Paul. 1966. J-Paul Sartre répond. L’Arc. nº30, 1966.